Em Artigo, advogado ex-eleitor do presidente pergunta:- Eleitor: você reconhece Bolsonaro hoje?

Pré-candidato é bem diferente daquele que muitos chamaram de "fenômeno", diz advogado


 Terça-feira, 09 de novembro de 2021 

“Se gritar pega ladrão, não fica um, meu irmão...”. Esse sambinha de breque, muito conhecido, foi cantado pelo Gen.Heleno Nunes, na campanha eleitoral de Bolsonaro/18, no Clube Militar do RJ, para simbolizar a chegada de um novo candidato e um novo Brasil. Era uma sátira pesada aos integrantes do Centrão

Uma nova política estava surgindo: “nada de tomá lá, dá cá; combate à corrupção; moralidade política; fim da corrupção; enfim, como todo demagogo, o paraíso chegou!!.

Bolsonaro representava o anti-Lula, o pavor da volta do ex-presidente ou de um “poste” (Hadad) em seu lugar. E, com essa cantilena, levou a taça.

O povo engoliu, aliás, como sempre fazemos, um novo salvador da pátria que chegava e, mais, com vestes de religião (“Deus enviou”).

Citando até, fora de contexto teológico (pois, o contexto do texto é uma crítica aos fariseus), o mote de palanque:“conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”.

É o “terrivelmente evangélico.....ou, “hipocritamente”: Deus, família, pátria, que sempre foram bordões de todos os políticos espertos no Brasil: Vargas, Lula, Sarney, Ciro, Dória, Dilma, os generais da Ditadura e outros. “Jesus” é uma marca forte, e não só na seara religiosa, que dá voto e dinheiro.

É uma mina de ouro. Com uma retórica incomum e vestindo uma fantasia de candidato de fora do sistema, contra "tudo isso que está aí", e “cristão novo” da invasão holandesa em Pernambuco, sec. XIX, o então deputado federal Jair Bolsonaro fez algo que era incomum até então: venceu uma eleição praticamente sem tempo de televisão e sem ser impulsionado por grandes e tradicionais caciques da política brasileira, que hoje, são militantes de “carteirinha”.

O sentimento anti-PT e o discurso de "outsider" pensado para as redes sociais lhe renderam a liderança em pesquisas eleitorais, depois da prisão do seu principal oponente: o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A prisão foi o maná dos céus, em boa hora derramado, pelos Moisés do TRF-4. Hoje, o que temos? Um presidente que quebrou todas as promessas; nos braços do Centrão e pagando uma fatura alta, que está corroindo a economia; a família envolvida na rachadinha, vendendo a alma ao diabo para se reeleger, ou não ser cassado.

 

Após dois anos e 10 meses de governo, inúmeras crises institucionais, escândalos, 607 mil mortos por causa da pandemia (negacionismo feroz das vacinas, uso de máscaras, charlatanismo ao vender remédios sem eficácia- CPI), “vacina causa AIDS”, ou vai “virar jacaré”- (os filhos e a mulher se vacinaram, e agora?); uma crise econômica gravíssima, o pré-candidato às eleições de 2022 é bem diferente daquele que muitos chamaram de "fenômeno", “mito”, cerca de três anos atrás.

 

Segundo pesquisa PoderData divulgada semana passada, 58% dos entrevistados reprovam seu governo. Os que aprovam são 33%; e com a volta de Lula ao páreo, tem sido extremamente prejudicial ao presidente, que aparece estacionado em segundo lugar em todas as pesquisas e perdendo para praticamente todos os candidatos em simulações de segundo turno, até novos "outsiders".

 

O jeito é voltar ou tentar voltar aos braços do povo, mesmo transfigurado totalmente (um novo Jonas, após três dias na barriga do peixe).

 

Os “fiéis” vão reconhecê-lo?). A militância aguerrida, as fake news diárias, com falsidade e absurdos; o discurso de confronto aos poderes instituídos, principalmente, o STF -  enganam-se os eleitores que pensam que Bolsonaro agora, “é paz e amor” lulista.

 

Continua o mesmo, recuou depois do 7 de setembro, porque viu que não tinha apoio para dar golpe, mas continua sonhando em se eternizar no poder (Somoza da Nicarágua, foi “reeleito” ontem, para o 5º mandato consecutivo); quem sabe o Centrão não dá uma ajudinha mudando a  esquecida CF ou um mandato de “senador” vitalício, mesmo sem povo ou “voto impresso”; e com apoio do “meu exército”; da PGR-Aras; e  dos eternos donos do poder no Brasil-Centrão e, da massa de manobra indefinida chamada “evangélica”, que ninguém sabe a que “Deus serve ou manipula”, através dos novos “apóstolos”, “bispos/as” ou outros enviados, que conhecemos.?

 

E, ainda, confundindo o Brasil-“Estado laico” da CF, com uma nova teocracia, com seus ministros “terrivelmente evangélicos” (será que emplaca o André Mendonça- pastor presbiteriano, no STF?). Uma pauta de costumes – guerra ao aborto; proibição de a vítima registrar BO de estupro ou ser atendida pelos SUS (a ministra Damares, da Família e Direitos Humanos, e também, terrivelmente evangélica, com uma história mal contada de “adoção” de uma menina indígena, que a mãe contesta até hoje, diz a mídia)); armamento do povo, para uma pretensa autodefesa, e outras pautas de agrado de uma indefinível “direita”. No recente Encontro do G-20/ Roma, Bolsonaro aproveitou (como fez na ONU), para apresentar um ‘novo” Brasil, que só ele conhece e governa.

 

No discurso, Bolsonaro disse que ”o Brasil se comprometeu com um programa extensivo e eficiente de vacinação, em paralelo a uma agenda de auxílio emergencial e preservação do emprego para a proteção dos mais vulneráveis”. Não mencionou, contudo, a demora para o início da campanha nacional de vacinação ou o fato de ele próprio não se vacinou e que seguiu semeando dúvidas sobre os imunizantes contra o coronavírus, algo que levou Facebook e YouTube a retirar do ar o vídeo de uma de suas lives.  

 

E, também, as dificuldades para avançar no Congresso Nacional com qualquer das reformas estruturantes com as quais sua gestão se diz comprometida, a não ser pagando ágio ao Centrão. Um Bolsonaro bem mais próximo da realidade se revelou diante do presidente turco Recep Tayyip Erdogan de extrema direita.

 

Em breve conversa informal, intermediada por tradutores e flagrada pelo colunista do EL PAÍS Jamil Chade, o presidente disse que a economia nacional está “voltando bem forte” —na verdade, começam a surgir projeções de recessão para 2022, que a “Petrobras é um problema”, porque o Governo estaria enfrentando uma reação muito grande por quebrar seus monopólios, e que ele mantém “um apoio popular muito grande” —a aprovação de seu Governo não ultrapassa os 30% ,em nenhuma pesquisa de opinião. “Temos uma boa equipe de ministros. Não aceitei indicação de ninguém.

 

Foi eu que botei todo mundo. Prestigiei as Forças Armadas. Um terço dos ministros é de militares profissionais.(O tal “meu exército”, por certo.) e prosseguiu: ”Não é fácil. Fazer as coisas certas é mais difícil”. Não sei o eleitor/a se reconhece hoje nesse perfil de governo de Bolsonaro; ou, como é nosso destino de tragédia grega de nação, continuarmos comprando “gato por lebre”, com riscos de trocar, em 2022, “seis por meia dúzia”, ou embarcar numa “nova canoa” de algum “salvador da pátria’- terceira via.

 

Confesso que, ex-votante do mito, estou indeciso: não reconheço o mito que ajudei a eleger em 2018, nem me sentiria feliz, agora, votando aos braços do antigo “salvador da pátria”.

 

As urnas trarão a resposta: um “novo” Brasil ou o abraço de afogado do atual.  A tal terceira via, que não seja, “mais do mesmo”.


 

Auremácio Carvalho é advogado.

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