5,2 milhões de crianças vivem na extrema pobreza no Brasil
Crianças e jovens são os mais afetados pela pobreza no Brasil, segundo o IBGE.
Imagem: Arquivo da internet
Os indicadores sociais revelam uma realidade perversa para crianças e jovens no Brasil. No ano passado, 12,5% da população brasileira de 0 a 14 anos vivia na extrema pobreza e 43,4% na pobreza, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgados nesta semana.
Em números absolutos, são 5,2 milhões de brasileiros de 0 a 14 anos na extrema pobreza – o equivalente a quase toda a população da Dinamarca – e 18,2 milhões na pobreza – pouco mais do que o número de habitantes do Chile.
A pesquisa mostrou um outro dado alarmante: entre todos os grupos etários, o porcentual de pobreza por contingente populacional tem maior concentração nas crianças e jovens.
Segundo o IBGE, é considerado em situação de extrema pobreza quem dispõe de menos de US$ 1,90 por dia, o que equivale a aproximadamente R$ 140 por mês. Já a linha de pobreza é de rendimento inferior a US$ 5,5 por dia, o que corresponde a cerca de R$ 406 por mês. Essas linhas foram definidas pelo Banco Mundial para acompanhar a pobreza global.
“A CRIANÇA POBRE TEM OBVIAMENTE MENOS OPORTUNIDADE DO QUE A CRIANÇA NÃO POBRE, TEM MUITO MENOS ACESSO AO INVESTIMENTO EM CAPITAL HUMANO”, AFIRMA O ECONOMISTA E PROFESSOR DA PUC DO RIO DE JANEIRO JOSÉ MARCIO CAMARGO.
Em relação a 2016, houve uma ligeira piora. Há dois anos, 11,4% dos brasileiros entre 0 e 14 anos estavam na extrema pobreza e 42,9% na pobreza.
Historicamente, o Brasil sempre foi um país com pobreza concentrada em crianças e jovens. E, apesar do retrocesso recente, as condições destes grupos até melhoraram nas últimas décadas com a implementação de programas sociais, como o Bolsa Escola, nos anos 90, depois incorporado ao Bolsa Família.
A dificuldade de uma mudança estrutural, segundo analistas, se dá pela escolha do Brasil de priorizar o gasto público nos mais velhos, sobretudo com o modelo atual do sistema previdenciário.
O sistema de aposentadoria do Brasil é considerado um ponto fora da curva quando comparado com o de outros países. O Brasil tem 8,5% da população com mais de 65 anos e gasta 13% do Produto Interno Bruto (PIB) com Previdência. No Japão, um terço da população é composta por idosos, mas a despesa previdenciária é de 10%.
“OS NÚMEROS DA FOTOGRAFIA DA POBREZA MOSTRAM QUE O TRATAMENTO DADO PARA OS VÁRIOS GRUPOS É DIFERENTE. E ISSO FICA EVIDENTE PORQUE, DE ALGUMA FORMA, CRIANÇAS E JOVENS ESTÃO EM CONDIÇÕES DE MENOR IGUALDADE EM RELAÇÃO ÀS GERAÇÕES MAIS VELHAS”, DIZ O DIRETOR DA FGV SOCIAL, MARCELO NERI.
Um levantamento conduzido pelo pesquisador também ajuda a revelar como a estrutura atual do país deixa os mais jovens desprotegidos. No biênio de 2016 e 2017, a probabilidade de uma criança entrar no campo da pobreza era de 8,9%. Entre os idosos, ficou em 1,6%.
E, de fato, os próprios números do IBGE reforçam que os indicadores sociais são muito melhores para os que têm 60 anos ou mais. Em 2017, 1,7% eram extremamente pobres e 8,1% eram pobres.
Programas ajudaram no combate à pobreza
Os programas sociais criados nas últimas décadas ajudaram a mitigar a pobreza entre os mais jovens porque passaram a fazer uma espécie de concorrência com o mercado de trabalho ao exigirem a matrícula de crianças em escola para o pagamento de benefícios.
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Nos anos 90, por exemplo, uma criança de uma família que estava entre as 20% mais pobres da população, podia contribuir com até 30% da renda per capita familiar, por meio do trabalho.
“ISSO SIGNIFICAVA QUE, SE ESSA CRIANÇA SAÍSSE DO MERCADO DE TRABALHO E FOSSE PARA A ESCOLA PARA ESTUDAR, A FAMÍLIA PERDERIA 30% DA RENDA PER CAPITA”, AFIRMA MARCIO CAMARGO. “PARA UMA FAMÍLIA POBRE, É MUITO DINHEIRO.”
Uma análise detalha do impacto do Bolsa Família por faixa etária também mostra como o programa é eficiente para reduzir a pobreza entre os mais jovens. Em 2017, de acordo com Neri, entre as famílias contempladas pelo programa, as crianças de 0 a 4 anos eram beneficiadas com uma valor do benefícios oito vezes superior ao dos idosos.
“OS PROGRAMAS COMO BOLSA ESCOLA E BOLSA FAMÍLIA TIVERAM AS CRIANÇAS COMO GRANDES BENEFICIÁRIAS. NÃO FORAM SUFICIENTES PARA REVERTER A TENDÊNCIA COMO UM TODO, MAS AJUDARAM A NIVELAR O CAMPO DE JOGO”, DIZ NERI.
País deve enfrentar encruzilhada
O Brasil deve enfrentar uma encruzilhada para definir o rumo do gasto público no futuro diante de uma provável combinação de milhões de crianças e jovens na pobreza em uma sociedade que será cada vez mais velha e que deve demandar mais gastos do governo – não apenas em Previdência, mas em saúde.
“OS DOIS EXTREMOS VÃO PRECISAR DO ESTADO, MAS O PAÍS NÃO PODE ABRIR MÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS ATIVAS PARA A INFÂNCIA E JUVENTUDE”, AFIRMA O SUPERINTENDENTE EXECUTIVO DO INSTITUTO UNIBANCO, RICARDO HENRIQUES. “SERÁ PRECISO REORGANIZAR A POLÍTICA E ELA NÃO PODER SER PUNITIVA PARA OS MAIS POBRES.”
Neste mês, o IBGE divulgou que a expectativa de vida ao nascer no Brasil era de 76 anos em 2017, um aumento de três meses e onze dias em relação ao ano anterior. A expectativa da FGV é que a proporção de idosos entre a população total do país cresça 488% nos próximos 50 anos.
“UM GASTO PÚBLICO COM EDUCAÇÃO COSTUMA FAVORECER MAIS A CRIANÇA, O GASTO COM SAÚDE BENEFICIA MAIS O IDOSO”, DIZ NERI. “O PAÍS VAI TER DE ENFRENTAR UMA SÉRIE DE AJUSTES NAS POLÍTICAS PÚBLICAS, COM FAIXAS MAIS E MENOS IMPACTADAS PELAS TOMADAS DE DECISÃO.”
Por ora, segundo o pesquisador da FGV, as pesquisas indicam que o retorno do investimento social nos mais jovens tem sido melhor do que em faixas etárias superiores porque as crianças têm mais anos para se beneficiar dos investimentos e, portanto, a possibilidade de transformação social deste grupo é maior.
“A POLÍTICA SOCIAL BRASILEIRA DEIXA A PESSOA VIVER UMA VIDA MISERÁVEL E, NO FIM DA VIDA, ELA GANHA UM BILHETE PREMIADO E PASSA A TER UMA RENDA MAIOR”, DIZ NERI. “NÃO QUE ESSA RENDA SEJA SUFICIENTE. MAS É ALGO QUE NÃO FAZ SENTIDO PARA O CICLO DE VIDA DE UMA PESSOA.”
Com informações e texto do G1

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