IRRESPONSABILIDADE DA PF - Cidade de Mineiros vive dias de pânico, com superpopulação de Perus.
Ato de irresponsabilidade da PF paralisou unidade da BRF de
cidade do sudoeste de Goiás, e 25 mil animais deixam de ser abatidos por dia.
Carne
Fraca: Perus com 20 kg, prontos para o abate, permanecem nas granjas, o que
pode gerar um problema grave para a cidade de Mineiros
Reportagem publicada pelo Estadão dá
conta, agora com as tintas do surrealismo, da irresponsabilidade da Polícia
Federal na divulgação da chamada Operação Carne Fraca. Como já
escrevi aqui, a única carne que anda fraca no país é a da institucionalidade.
Vamos falar de uma cidade que tinha uma economia regular, estável, que garantia
aos moradores uma vida digna.
E, da noite para o dia, sobreveio o caos.
Estamos falando da cidade de Mineiros, no sudoeste
de Goiás, com pouco mais de 60 mil habitantes. Parte importante do dinheiro que
circula na cidade, da renda de sua população, de seu bem-estar, deriva da
criação e abate de peru. Há nada menos de 219 granjas na cidade. Por dia, a
unidade da BRF que foi interditada abatia 25 mil aves.
Pois bem! Tudo parou.
Os criadores não têm a quem vender os animais. Desde a
patuscada estrelada pela Polícia Federal, 150 mil perus deixaram de ser
abatidos. O problema é maior do que parece. Em razão de especificações técnicas
da BRF e da exigência do mercado comprador, o peso máximo do animal tem de ser
25 kg. Acima disso, a empresa rejeita o animal. O peso médio de abate é, na
verdade, 20 kg.
Ocorre que os animais que já atingiram o peso continuam
nas granjas. E continuam comendo. E ganham peso. Se passar dos 25 kg, o que é
muito provável, a BRF já não poderá comprá-los. O frigorífico teve renovada sua
licença sanitária em fevereiro, no mês passado.
Informa a reportagem que as granjas de Mineiros abrigam
hoje 4,3 milhões de perus, que são mantidos em ambiente com ventilação
constante de 27 graus.
Questão ambiental
Há ainda uma questão gravíssima, também ambiental. Os
perus começam a morrer quando atingem 25 kg. Em mais alguns dias, esses 150 mil
perus não poderão mais ser comprados pela BRF. Inexiste estrutura na cidade
para fazer o abate e descarte dos animais. O que se fará com essa montanha de
carne?
Toda a cadeia
O caso dos criadores de Mineiros é especialmente aflitivo
porque os animais estão crescendo, eles precisam dar alguma destinação aos
bichos e não se sabe o que vai acontecer. Mas as coisas vão além, não é?
Caminhoneiros às pencas que faziam o transporte dos perus
abatidos também estão parados. Produtores agrícolas de matéria-prima para ração
também estão em desespero no Brasil inteiro. Como afirmou um ouvinte do
programa “Os Pingos nos Is”, as despesas do produtor já foram contratadas.
A situação é, sim, muito grave. E é pouco o que o governo
pode fazer. Barreiras sanitárias, uma vez impostas, demandam tempo até que
sejam revistas. Há etapas técnicas que têm de ser cumpridas.
Absurdo
Mais passa o tempo, mais absurda a operação se mostra.
Digamos que haja mesmo três dezenas de fiscais envolvidos com lambança. É claro
que a PF deveria investigar. E que a informação viesse a público, mas de outro
modo, não é?
A atuação da PF poderia ser exemplar na identificação das
fraudes, mas para evidenciar que o setor continua comprometido com a excelência
técnica. Em vez disso, anunciou-se ao mundo que o país vende carne podre,
misturada a papelão, com produtos cancerígenos.
Não tenham dúvida de que podem vir a público evidências
de fraude aqui e ali. Nada, é evidente, que justifique aquelas barbaridades.
Contratando clérigos muçulmanos
Muita gente desconhece essa informação. Em algum momento,
eu já esbarrara nelas, mas havia me fugido da memória. Conversava ontem com um
empresário da área. Ele me pediu licença, por segundos, para dar uma resposta a
alguém que lhe fizera uma indagação.
Ao voltar, desculpou-se: “Tinha de resolver uma questão
aqui com um clérigo muçulmano…”.
E eu: “Clérigo muçulmano?”.
E ele me lembrou que, para ganhar o mercado internacional
e ser líder, os empresários contratam, por exemplo, religiosos muçulmanos para
que acompanhem o abate e processamento de animais.
Sim, senhores! Há regras no Alcorão para o abate, e os
frigoríficos contratam religiosos, como funcionários mesmo, para certificar que
tudo é feito conforme a exigência. Chama-se abate “Halal”.
Eis as regras:
– só se abatem animais saudáveis;
– antes do abate, dizer “frase “Em nome de Alá, o mais
bondoso, o mais Misericordioso”;
– a faca tem de ser afiada para que a sangria ocorra em
uma só etapa: o corte tem de atingir traqueia, esófago, artérias e a veia
jugular. Todo o sangue se esvai. Esse é considerado um método piedoso. Suponho
que haja uma adaptação para a mecanização do abate;
– religiosos acompanham tudo para que a carne seja
certificada e possa ser vendida a países muçulmanos.
Por quê?
Por que lembrei isso num texto que começa dando conta do
risco que corre uma cidade em razão da irresponsabilidade da PF? Para
demonstrar que existe um setor de excelência no Brasil, que vai a detalhes e
cumpre exigências que são ignoradas por pessoas que não são da área.
Eis aí: homens de estado, que manipulam instrumentos de
repressão e coação, segundo regras do estado democrático e de direito, não
podem atuar ao arrepio da lei que os legitima.
Por Reinaldo Azevedo – VEJA.
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