Mais desemprego, menos arrecadação - Ford gasta fortuna para deixar de produzir no Brasil.

O adeus  bilionário 


 Terça-feira, 11 de janeiro de 2022 

Há exatamente um ano, em 11 de janeiro de 2021, a Ford anunciava o encerramento da produção de veículos no Brasil, surpreendendo de funcionários a clientes. Com mais de um século de presença em nosso mercado, a primeira montadora instalada no País alegou que a drástica decisão fora motivada por "anos de perdas significativas", tornando insustentável a operação local de manufatura. 

Para fechar suas fábricas em Camaçari (BA) e Taubaté (SP) ao longo dos meses seguintes, a companhia teve de desembolsar uma fortuna com indenizações a milhares de funcionários e centenas de concessionários - sem contar a devolução de recursos públicos, como incentivos fiscais e empréstimo de banco estatal.

A Ford não menciona o quanto gastou no total para desmobilizar suas atividades fabris em solo brasileiro. Contudo, logo ao anunciar a mudança de estratégia, a empresa informou que havia alocado US$ 4,2 bilhões para esse fim. O montante correspondia a cerca de R$ 22 bilhões no início do ano passado e, no câmbio atual, equivale a R$ 23,8 bilhões.

Segundo sindicatos consultados, o acordo da marca oval azul definiu pagamento mínimo de R$ 130 mil a cada trabalhador dispensado, incluindo até dois salários adicionais por ano trabalhado e adicional por tempo de serviço. 

Responsável pela produção de motores e transmissões, a fábrica de Taubaté teve cerca de 800 funcionários diretos desligados e estendeu suas atividades, para produzir peças de reposição, até julho do ano passado. 

Já a unidade de Camaçari, responsável pela montagem de Ka, Ka Sedan e EcoSport, além da produção de motores, dispensou cerca de 4.000 funcionários e fechou as portas em dezembro passado. 

Em 2019, a oval azul já havia encerrado as atividades da fábrica de São Bernardo do Campo (SP), aposentando sua linha de caminhões e decretando o fim da linha para o Fiesta. 


Devolução de bilhões em dinheiro público.

Em julho de 2021 a Ford pagou R$ 2,14 bilhões ao governo da Bahia. O valor, corrigido, estava previsto em termo aditivo de contrato firmado pelas partes em 2014, quando a Ford se comprometeu a investir no complexo industrial de Camaçari, mediante incentivos fiscais para financiar capital de giro concedidos pelo Estado. 

"Com a decisão da Ford de fechar o complexo em definitivo, estes benefícios foram o parâmetro contratual para se fixar ao valor da indenização devida pela empresa, acrescidos de correção monetária", diz nota enviada pelo governo baiano. 

Em janeiro do ano passado, a empresa também mantinha dois contratos de financiamento com o BNDES, assinados em 2014 e 2017, totalizando R$ 335 milhões - além de outros 30 contratos de financiamento indireto, no valor de R$ 54,2 milhões. 

Segundo o banco de fomento público, vinculado ao Ministério da Economia, os dois empréstimos diretos já foram quitados pela companhia, enquanto os financiamentos indiretos têm sido honrados. 


Concessionárias cobravam R$ 1,5 bilhão.

Após o anúncio do fim da produção nacional, a rede de concessionários, então com 283 unidades, iniciou uma tumultuada negociação com a Ford para tratar das indenizações aos revendedores que teriam os respectivos contratos encerrados na nova fase -na qual a oval azul passaria a ser apenas uma importadora de veículos. 

Conforme noticiado por UOL Carros na época, ainda em janeiro de 2021, a Abradif (Associação Brasileira dos Distribuidores Ford) rejeitou a proposta inicial feita pela companhia e demandou o rompimento imediato de todos os contratos ativos, para posterior contratação dos distribuidores que efetivamente permaneceriam com a marca. 

A demanda por ressarcimento superava R$ 1,5 bilhão - valor de toda a rede, estimado pela associação na época. 

Por meio de correspondências endereçadas à alta cúpula da Ford, a Abradif alegava temor de a companhia deixar definitivamente o País dentro de poucos anos e dizia que o respectivo faturamento despencaria cerca de 80% com a descontinuação dos modelos nacionais. 

A entidade também cobrava o desbloqueio de R$ 200 milhões provenientes do FAV (Programa de Aquisição de Veículos), fundo controlado pela montadora e custeado pelos seus distribuidores para facilitar a compra de veículos Ford para revenda ao consumidores, sem incidência de juros e com subsídio parcial do IOF. 

Procurada, a Ford se limitou a informar que hoje sua rede encolheu para 110 distribuidores autorizados e que as tratativas estão "praticamente finalizadas". 

A empresa se negou a comentar o montante efetivamente pago - a Abradif, por sua vez, ignorou pedido de informações feito por esta reportagem. 


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