"A perseguição contra Deltan Dallagnol e a Lava Jato continua"

Nenhum dos que se dizem ofendidos foi capaz de apontar uma única irregularidade que Dallagnol tenha cometido na condução da Lava Jato


"A tentativa de desmonte da Operação Lava Jato, até agora a mais bem sucedida operação de combate à corrupção do país, terá mais um capítulo nesta terça-feira, 18 de agosto, quando o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) pode cometer uma injustiça sobre injustiça. 

Após terem imposto uma absurda pena de advertência ao procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato, em novembro de 2019, os conselheiros podem até mesmo removê-lo da operação, caso deem razão aos senadores Renan Calheiros (MDB-AL) e Kátia Abreu (PP-TO) – aquele é autor de uma reclamação que se tornou processo disciplinar; esta pediu ao CNMP a “remoção compulsória por interesse público” do procurador.

Assim como ocorreu no caso que gerou a advertência de 2019, trata-se única e exclusivamente de cercear o direito do procurador à liberdade de expressão. Afinal, nenhum dos que se dizem ofendidos foi capaz de apontar uma única irregularidade que Dallagnol tenha cometido na condução da Lava Jato. 

O atual presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, não gostou das críticas feitas pelo procurador a decisões da turma em que ele e os ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski formavam maioria, com votos que sempre beneficiavam os réus da operação – foram essas críticas que levaram ao processo disciplinar julgado no ano passado. 

Da mesma forma, Calheiros se incomodou com o fato de Dallagnol ter pedido voto aberto na eleição para a presidência do Senado, no início de 2019, acrescentando que uma vitória do alagoano representaria um retrocesso na luta contra a corrupção. 

Kátia Abreu nem isso foi capaz de fazer, baseando seu pedido no fato de já haver uma série de outras queixas contra Dallagnol no CNMP; no acordo feito entre a Lava Jato, a Petrobras e o governo norte-americano para permitir a repatriação de recursos; e na realização de palestras remuneradas, prática permitida pelo CNMP.

"O que está em jogo agora é a independência do membro do Ministério Público e seu 
direito à liberdade de expressão"

A própria condução do processo está repleta de pontos nebulosos, que levaram Dallagnol a buscar o Supremo Tribunal Federal para conseguir sua suspensão – para se ter uma ideia, os casos entraram na pauta do CNMP antes mesmo que Dallagnol e as testemunhas de defesa fossem ouvidos. 

O conselho está com a composição incompleta – tem 11 membros, quando deveria ter 14 – e há movimentações para burlar a regra constitucional, prevista no artigo 128, I, b, que só permite a remoção por interesse público de um membro do MP por maioria absoluta, o que exigiria oito votos. 

Todos esses aspectos já são suficientemente graves para se constatar que qualquer punição seria uma arbitrariedade, mas as possíveis violações processuais chegam a empalidecer diante do que representaria, no fim das contas, a condenação de Dallagnol no CNMP.

Afinal, o que está em jogo agora, como esteve em novembro do ano passado, é a independência do membro do Ministério Público e seu direito à liberdade de expressão. 

São ameaças tão graves que mobilizaram dezenas de outros integrantes do MP, dentro e fora da força-tarefa, que apontam também para o risco de se constatar que a instituição é incapaz de proteger seus membros que atuam no combate à corrupção, deixando-os à mercê da fúria retaliatória de investigados e réus. 

Os alvos da Lava Jato são os autores da maioria das dezenas de reclamações feitas até agora contra Dallagnol, praticamente todas rejeitadas antes mesmo se tornarem processos administrativos.

O fato é que nem nas referências a ministros do STF, nem nos comentários sobre a disputa pela presidência do Senado, Dallagnol se afastou do decoro pedido pela lei ao membro do Ministério Público. 

O procurador nada mais fez que recordar uma obviedade inescapável a qualquer brasileiro minimamente informado, dado o histórico de Calheiros, investigado e réu por vários escândalos; são observações cujo objetivo era reforçar o combate à corrupção, e não denegrir este ou aquele postulante à cadeira de presidente do Senado. 

Aliás, os tuítes que motivaram a reclamação de Calheiros são até mesmo anteriores à formalização da candidatura do alagoano, ocorrida apenas em 31 de janeiro de 2019, véspera da eleição.



Digoreste News com Gazeta do Povo

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