Escrevente diz que fez documento de venda de sítio para o nome de Lula

Funcionário de cartório diz ter elaborado minuta a pedido de compadre de ex-presidente.

Lula e o ex-presidente da OAS, Leo Pinheiro, em visita ao sítio de Atibaia. Foto reprodução


O escrevente João Nicola Rizzi disse ao juiz Sergio Moro ter sido o responsável pela confecção de uma minuta de venda do sítio Santa Bárbara, em Atibaia (SP), para transferir o imóvel do empresário Fernando Bittar para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a ex-primeira dama Marisa Letícia por R$ 800 mil. O depoimento foi prestado, na manhã desta quarta-feira, no terceiro processo em que o petista é réu na Lava-Jato de Curitiba.

Segundo o cartorário, o documento foi elaborado pelo 23º Tabelionato de Notas e a pedido do advogado Roberto Teixeira, compadre de Lula. Rizzi disse que deixou em branco os campos de compradores, onde constariam nomes do ex-presidente e de Marisa. O mesmo escrevente também contou que já havia feito, também a pedido de Teixeira, a escritura do imóvel nos nomes de Bittar e do também empresário Jonas Suassuna, em outubro de 2010.


— Roberto Teixeira pediu para eu elaborar a minuta que era para o Lula — afirmou Rizzi.

No entanto, a transferência para o ex-presidente nunca foi formalizada e a minuta nem sequer assinada.

Segundo a denúncia do Ministério Público Federal (MPF), Lula ocultou a propriedade do imóvel, que no papel está em nome de Bittar. O petista também é acusado de ter recebido benfeitorias no valor de cerca de R$ 1 milhão em bens e obras de reforma a cargo de empresas como OAS e Odebrecht.

SÓCIO DE BUMLAI ORIENTOU REFORMA

De acordo com a acusação do MPFl, as reformas no sítio foram feitas em três fases, pelo pecuarista José Carlos Bumlai, pela empreiteira Odebrecht, e por fim, pela empreiteira OAS.


Segundo os procuradores, o pecuarista José Carlos Bumlai realizou obras no sítio de Atibaia por meio de uma de suas empresas, a Usina São Fernando. Entre 2004 e 2005, Bumlai teria auferido, segundo os procuradores, uma vantagem indevida de R$ 54 milhões em uma operação de empréstimos com o Banco Schahin para pagar dívidas de campanha do PT. O Grupo Schahin, por sua vez, teria sido beneficiado pela assinatura de um contrato com a Petrobras para a operação do navio-sonda Vitória 10.000.


Segundo a denúncia, Lula teria se aproveitado dos ganhos obtidos por Bumlai na operação para pedir que realizasse reformas no sítio em Atibaia. As reformas das obras teriam sido bancadas por empresas do grupo do frigorífico Bertin a pedido de Bumlai. O pecuarista era sócio do grupo na Usina São Fernando.

A engenheira civil Ana Carolina de Souza Lima Siqueira Azevedo, funcionária do grupo Bertin, também foi ouvida nesta quarta-feira como uma das testemunhas convocadas pelo Ministério Público Federal. Ela confirmou que recebeu a orientação de um dos acionistas do grupo, Reinaldo Bertin, para negociar com Igenes Neto, gerente de obras do grupo, a prestação de serviços para a reforma de uma propriedade em Atibaia.

Foi em nome de Igenes Neto que, segundo o Ministério Público Federal, foram emitidas as notas fiscais de fornecedores da obra. Para o MPF, o nome de Igenes foi utilizado para ocultar e dissimular a origem do dinheiro, com o propósito de dificultar eventuais investigações e rastreamento dos valores. A engenheira contou que Reinaldo Bertin autorizou essa forma de pagamento. Questionada sobre o motivo para realizar as transferências diretamente para Igenes, Ana Carolina afirmou que não se lembrava como essa operação havia sido acertada.

— Eu não lembro da circunstância em que foi definido esse formato — disse.

Logo depois, o procurador Athayde Ribeiro Costa perguntou se a emissão de notas em nomes de outra pessoa era comum e se Ana Carolina tinha autonomia para tomar esse tipo de decisão:

— Não é comum. Não (tinha autonomia) — respondeu Ana Carolina.


Além da engenheira, o juiz Sergio Moro também ouviu Mario da Silva Amaro Junior, gerente da loja Kitchens em que o arquiteto da OAS Paulo Gordilho acertou a compra de uma cozinha planejada para a propriedade em Atibaia. O gerente confirmou que Gordilho pediu para que as notas fiscais fossem emitidas em nome de Fernando Bittar, que consta como proprietário do imóvel e é sócio de um dos filhos de Lula, Fábio Luis. Amaro afirmou que Gordilho pagou os R$ 170 mil referentes à cozinha em espécie.



Com "Oglobo"